quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Poema do nosso Mário de Sá-Carneiro

NOTA: um poema que demonstra à exaustão que a "luta" entre Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro, teriam sido os maiores vultos dos Modernismo e Pós-Modernismo, caso o segundo não se tivesse suicidado em Abril de 1916.Sá-Carneiro é, sobretudo, um narcisista...Fala de si, e de si, e de si...das suas mágoas, dos desaires da sua vida. E como não pôde atingir a vida que idealizou,outra coisa não faz senão fugir da que Deus lhe deu.
Este poema "QUASE" diz isso mesmo: pouco faltava , sempre, para se sentir feliz ,para ter uma existência nova...Mas, embora a visse prestes a raiar nunca conseguia deitar-lhe a mão. É o tal "quase", que, afinal, nos falta a todos para LÁ Chegarmos!


NOTA DE Maria Elisa Rodrigues Ribeiro
12/10/2017









Poema de Mário de Sá-Carneiro, in Net:




Quási
Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe d'asa...
Se ao menos eu permanecesse àquem...



Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num baixo mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dôr! - quási vivido...


Quási o amor, quási o triunfo e a chama,
Quási o princípio e o fim - quási a expansão...
Mas na minh'alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!


De tudo houve um começo... e tudo errou...
- Ai a dôr de ser-quási, dor sem fim... -
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,
Asa que se elançou mas não voou...




Momentos d'alma que desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ansias que foram mas que não fixei...




Se me vagueio, encontro só indicios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sôbre os precipícios...


Num impeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...


. . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . .


Um pouco mais de sol - e fôra brasa,
Um pouco mais de azul - e fôra além.
Para atingir, faltou-me um golpe de aza...
Se ao menos eu permanecesse àquem...




ESCRITO EM PORTUGUÊS DOS PRINCÍPIOS DO SÉCULO XX; USOU, ainda, no entanto, a Língua do século XIX.


Mário de Sá-Carneiro, in 'Dispersão'

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